sexta-feira, 21 de março de 2014

Não perdoar, nunca perdoar
Deus, que é dado a este
tipo de fraqueza infantil, que os perdoe.
Perdoe a história, que é puta adestrada das circunstâncias
Perdoe a geografia, a evolução, a situação.
O Agressor? O Opressor?
Quando nos jogaram em porões de caravelas
Quando nos impuseram uma dieta de salmos
Quando acorrentaram até os nossos fetos
Não houve afrouxamento. Hoje, o ocidente diz
Que desfilar as nádegas nuas em Ipanema
É liberdade.
E Há quem pinte esses murais
Há quem reproduza essas etiquetas
Liberdade, essa inexistente criatura
Que só os que morrem podem conjurar
Não nos chegará de navio, ou avião
Não chegará por meio de tratados e assinaturas
Só chegará quando não perdoarmos mais
Quando o olhar dócil e amarelado, se transfigurar em 
Ânsia vermelha, em grito de basta.
Quando o último negro arredio, fugir de sua Senzala Mental
E fazer transbordar nas ruas, suas lágrimas de Ira.

domingo, 16 de março de 2014

Manhã Gloriosa IV


...É a morte. A última transcendência. A última
Vertigem.
- E eu estou doente. Eu estou muito doente.
Queria viver como um cão. Contemplativo.
Uma vida totalmente sensorial, repleta de
Instintos, e emoções pungentes. E curta
Ah! Como é gloriosa e curta a vida dos cães!
A dos homens, por outro lado, se estende
Enfermiça, enfadonha, repleta de clichês.
Cheia de dias cinzas, de noites frias, e verões
Sufocantes. E no fim, bem no fim,
Deitamos na sombra do tempo ido
Fechamos os olhos e dormimos.
Mas só depois de termos estado bem doentes
- Nascemos miseravelmente doentes.

sexta-feira, 14 de março de 2014

Manhã Gloriosa II

Implodir
Por dentro, desmoronar
Afogar-se em escombros
De si
Soterrar-se
Sepultar-se em cal
Em sal
No ar cáustico
Corroer-se,
Verme de si.

sábado, 8 de março de 2014

Sobre negras prisões, ou existências.

O choque dos corpos- Newtoniana melodia- Uma sinfonia de sussurros inaudíveis para quem existe além do quarto. Existem? Pois sim? Regresso minha mente ao quarto. A cama. Aos corpos. Aos choques, agindo e reagindo, pequenos gestos me indicam os passos a seguir. Totalmente inexperiente do seu corpo, tateio como um cego sem cão, sem mãos. A língua, sedenta, mapeia cada recanto, cada guta, cada depressão de tuas coxas. Imerso em suor, mergulho em ti, obliterado, estasiado, vacilante. Deliro, suspiro, desejo, não paro, já exausto, não paro. Tal qual uma criatura marinha, emergindo das imensidades profundas dos abismos, teu gozo vem, devagar...Explode na superfície, rompendo o tímido e frágil véu que me protegia das tuas vastidões inexploradas - por mim- e me joga num limbo, numa dimensão além. Não me recomponho, nunca me serei meu novamente. O quarto, a cama os outros pararam no tempo, às três da manhã e ainda estão lá... Eu ainda estou lá. Ermitão - perdido por querer- assentado de assalto, arma em punho, sem retorno, na posse dos terrenos das tuas coxas negras, teu ventre fértil e teus seios pagãos.
Amar-te? Não existe - Existe o choque dos corpos,os sussurros, a sinfonia. Além disso, nada mais é do que ilusão prolongada, deleite da lembrança...Prisão que me pus por vaidade.

domingo, 2 de março de 2014

Março.

Tudo no mundo é saudade
O coração exausto, dança
Nos olhos, essa obliquidade 
Que a vontade não mais alcança

Tudo no mundo é cansaço
Tudo nos sangra, nos fere
Ninguém nos carrega no braço
Em nossa dor, ninguém interfere 

- E esse carnaval agora?
 Essa folia, não é teu alento?

Há festa,calor e luz lá fora.
Mas há um frio negrume aqui dentro.