terça-feira, 6 de maio de 2014

Estou no Hades. Vocês me enxergam.Eu sei.
Daqui, não me calo, nem maldigo. Aceno devolta, condescendência. Deferência estúpida.
Pondo-se, o sol alaranjado pinta o horizonte com a mesma cor de sempre. Inútil descrever, todos sabem. Eu sei que estou sonhando. Não sou tão estúpido assim. Eu conheço esses terrenos. Eu sonhei a vida toda. Essa vastidão desperdiçada. Essa força nuclear, perpétua, imponderável, não movimenta sequer um cata-vento. Estou preso num limbo, um purgatório. E nesse Hades eu sonho. Não porque quero sonhar, e sim por que não me resta outra coisa. Tento mandar mensagens para os meus vivos, mas eles não ouvem. Então aceno. Estou meio vivo e meio morto. Sou uma aberração quântica de Schrödinger. Não há na terra quem me ouça? Um falso médium? Um Profeta?
O que eu diria? Eu não sei. Pediria ajuda? Amaldiçoaria Deus e os seus setenta e sete mil anjos? Eu pediria perdão? Meus pecados são menos inocentes do que antes, mas ainda sim são inocentes. Não.
Não me ouçam mais. Sou só mais uma alma amargurada, com moscas nos olhos. Deito-me na fria pedra. E sonho com ilhas e barcos, lindas mulheres e gigantes marítimos. É o que me resta. É o que me basta.


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